Em decisão final sobre a candidatura, TSE nega provimento a recurso da defesa de Piriquito
- Aderbal Machado
- 7 de dez. de 2022
- 13 min de leitura
RECURSO ORDINÁRIO ELEITORAL Nº 0600765-75.2022.6.24.0000 – FLORIANÓPOLIS – SANTA CATARINA
Relator: Ministro Carlos Horbach
Agravante: Edson Renato Dias
Advogados: Eduardo Ribeiro – OAB: 30785/SC e outros
Recorrido: Ministério Público Eleitoral

ELEIÇÕES 2022. RECURSO ORDINÁRIO ELEITORAL. REGISTRO DE CANDIDATURA. CARGO DE DEPUTADO ESTADUAL. INDEFERIMENTO. INELEGIBILIDADE. REJEIÇÃO DE CONTAS PÚBLICAS. CONVÊNIO. ORDENADOR DE DESPESAS. PREFEITO À ÉPOCA. ART. 1º, I, G, DA LC N. 64/90. INCIDÊNCIA. NÃO PROVIMENTO.
1. A rejeição de contas calcada em decisão irrecorrível, emanada do órgão competente, no exercício de cargo ou função pública, com nota de insanabilidade e por irregularidade que, em tese, constitui ato doloso de improbidade administrativa, desde que imputado débito, e não apenas sancionada com multa, atrai a inelegibilidade do art. 1º, I, g, da LC n. 64/90, salvo se suspensa ou anulada por pronunciamento judicial.
2. O advento da Lei n. 14.230/2021 alterou o panorama de incidência da inelegibilidade por desaprovação de contas públicas, passando a ser exigido o dolo específico, em superação ao dolo genérico (RO n. 0601046-26/PE, redator para o acórdão o Ministro Ricardo Lewandowski, PSESS em 10.11.2022).
3. A rejeição do ajuste contábil em tomada de contas especial, diante da omissão do dever de prestar contas, com a imputação de débito e multa, porquanto não comprovada a execução do objeto de convênio, notadamente por descumprimento do núcleo da avença, e não meramente das obrigações marginais, revela conduta consciente e direcionada do gestor e preenche os requisitos da inelegibilidade prevista no art. 1º, I, g, da LC n. 64/90, inclusive no que tange à sua conformação com a prática, em tese, de ato de improbidade administrativa mediante dolo específico.
4. Recurso ordinário ao qual se nega provimento.
Acordam os ministros do Tribunal Superior Eleitoral, por unanimidade, em negar provimento ao recurso ordinário, nos termos do voto do relator.
Brasília, 22 de novembro de 2022.
MINISTRO CARLOS HORBACH – RELATOR
RELATÓRIO
O SENHOR MINISTRO CARLOS HORBACH: Senhor Presidente, trata-se de recurso ordinário eleitoral formalizado por Edson Renato Dias contra acórdão do Tribunal Regional Eleitoral de Santa Catarina (TRE/SC), pelo qual indeferido o seu registro de candidatura ao cargo de deputado estadual, no pleito de 2022, por incidência da causa de inelegibilidade do art. 1º, I, g, da LC n. 64/90.
O aresto recorrido foi assim resumido pela Corte Regional:
ELEIÇÕES 2022 – REGISTRO DE CANDIDATURA – CANDIDATO AO CARGO DE DEPUTADO ESTADUAL – IMPUGNAÇÃO APRESENTADA PELA PROCURADORIA REGIONAL ELEITORAL – CONTAS JULGADAS IRREGULARES PELO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO – CONVÊNIO FEDERAL – DESCUMPRIMENTO – CAUSA DE INELEGIBILIDADE (ART. 1º, I, “G” DA LEI COMPLEMENTAR N. 64/1990) - TESE DEFENSIVA QUE EMBORA RECONHEÇA A DESAPROVAÇÃO DAS CONTAS, ALEGA QUE A CAUSA DE INELEGIBILIDADE INVOCADA NA INICIAL NÃO SERIA APLICÁVEL AO CASO EM ANÁLISE, EM RAZÃO DA AUSÊNCIA DA COMPROVAÇÃO DE DOLO – CONTAS JULGADAS IRREGULARES, COM COMPROVADO DANO AO ERÁRIO – DECISÃO DO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO QUE TRANSITOU EM JULGADO – DECISÃO IRRECORRÍVEL – IRREGULARIDADE INSANÁVEL RECONHECIDA PELO ÓRGÃO JULGADOR – CONDUTA TIPIFICADA COMO ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – DOLO CONSTATADO – IMPUTAÇÃO DE DÉBITO – PROCEDÊNCIA DA IMPUGNAÇÃO – INDEFERIMENTO DO REGISTRO. (ID n. 158232305)
O recorrente alega, em suma, que:
(i) na espécie, não se extrairia, da rejeição de contas, o elemento dolo, porquanto ausente a demonstração da intenção deliberada do então gestor de não aplicar os recursos públicos advindos do convênio em questão;
(ii) com o advento da Lei n. 14.230/2021, não mais se admitiria o dolo genérico, sendo imprescindível a comprovação do dolo específico;
(iii) superação de toda a jurisprudência anterior à vigência do aludido diploma legal, de modo a impossibilitar o reconhecimento da causa de inelegibilidade, tal como na hipótese, com base nesses precedentes; e
(iv) não preenchimento dos demais requisitos da alínea g do inciso I do art. 1º da LC n. 64/90, pois houve mero exercício regular da função pública.
O parecer da Procuradoria-Geral Eleitoral é pelo não provimento do recurso ordinário eleitoral (ID n. 158242944).
É o relatório.
VOTO
O SENHOR MINISTRO CARLOS HORBACH (relator): Senhor Presidente, conforme relatado, a matéria controvertida diz respeito à incidência da causa de inelegibilidade prevista na alínea g do inciso I do art. 1º da LC n. 64/90.
Na hipótese, o recorrente exerceu o mandato de prefeito do Município de Balneário Camboriú/SC nas gestões de 2009-2012 e 2013-2016, tendo respondido a tomada de contas especial, instaurada pelo Ministério do Turismo, em razão da não comprovação da aplicação regular dos recursos da União repassados àquele ente, por força do Convênio n. 634/2008 (Siafi 635843).
Conforme delimitado pelo Tribunal de Contas da União, o objeto do convênio consistia em “qualificar profissionais do setor de turismo para a melhoria da qualidade no atendimento aos turistas” do município (ID n. 158232259).
As contas foram julgadas irregulares, com imputação de débito e imposição de multa. Formalizado recurso de reconsideração, foi desprovido. Esse aspecto é relevante para, no exame do registro, a Justiça Eleitoral afastar a ressalva contida no § 4º-A do art. 1º da LC n. 64/90 (incluído pela LC n. 184/2021), de não incidência da causa de inelegibilidade por rejeição de contas públicas sem imputação de débito e sancionadas exclusivamente com o pagamento de multa.
Com efeito, para além da imposição de multa no valor de R$ 13.500,00, ao recorrente, enquanto gestor, foi imputado débito de R$ 148.224,00.
No exame do caso, tal como salientado pelo TRE/SC, não cabe aferir, nesta seara eleitoral, o acerto ou o desacerto da decisão pela qual a Corte de Contas desaprovou as contas do recorrente (Súmula n. 41/TSE), sendo da competência desta Justiça especializada, entretanto, extrair, do mencionado título, os elementos configuradores da inelegibilidade, ainda que dele não conste menção expressa acerca da prática de atos de improbidade administrativa (ED-REspEl n. 0600352-10/CE, Rel. Min. Benedito Gonçalves, DJe de 21.2.2022).
Com esses apontamentos iniciais, cabe enfrentar o argumento central do ora recorrente, no sentido da ausência de caracterização, em tese, de ato de improbidade administrativa na modalidade dolosa na sua rejeição de contas, com destaque para a tese de imprescindibilidade do dolo específico, dado o advento da Lei n. 14.230/2021, que alterou a Lei n. 8.429/92. Isso porque, não obstante o silêncio da Corte Regional, devidamente instada pelo recorrente, inclusive mediante a oposição de embargos de declaração, tem-se que o recurso ordinário não se sujeita às mesmas balizas do especial, sendo dotado de devolutividade ampla, viabilizando a apreciação da questão, que integra capítulo decisório efetivamente impugnado, nos termos do art. 1.013, § 1º, do CPC.
No recente julgamento do RO n. 0601046-26/PE, concluído na sessão de 10.11.2022, redator para o acórdão o Ministro Ricardo Lewandowski, o Tribunal Superior Eleitoral assentou, quanto ao art. 1º, I, g, da LC n. 64/90, que, considerada a inovação legislativa, especificamente a Lei n. 14.230/2021, a incidência da referida hipótese de inelegibilidade fica condicionada à constatação, por esta Justiça especializada, de que a rejeição de contas possa revelar, em tese, a ocorrência de ato de improbidade administrativa mediante dolo específico.
Desse modo, ficou superado o entendimento do TSE, calcado na legislação até então vigente, sobre a suficiência, nesses casos, do dolo genérico.
Assim, a conformação do caso concreto à métrica do dolo específico será aferida a partir do cotejo das irregularidades retratadas no acórdão do TCU.
Feito esse apontamento, verifica-se que, na tomada de contas especial em comento, o Tribunal de Contas da União acentuou, prefacialmente, o fato de “a omissão no dever de prestar contas constituir grave irregularidade. Aliás, a omissão no dever de prestar contas ocorre em razão da violação de dispositivos explícitos dos ajustes, bem como da sua legislação de regência (Constituição Federal, Decreto 93.872, instruções normativas e portarias)” (ID n. 158232259).
No tocante às irregularidades, consignou o TCU que:
13.2. Conforme apresentado no Parecer Técnico de Prestação de Contas 18/2014 - CGQC/DCPAT/SNPDTur/MTur (peça 151), foram observadas diversas irregularidades na execução do objeto do Convênio 634/2008 para além daquelas informadas pelo recorrente, quais sejam:
a) ausência da relação dos treinados (listagem relacionando o quantitativo, nome, telefone, cpf, endereço dos alunos que foram capacitados, devidamente assinada pelo responsável técnico);
b) não fixação da logomarca do Ministério do Turismo nos folders produzidos, bem como nas camisetas confeccionadas para o projeto;
c) ausência de instrumento que comprove a contratação dos professores responsáveis pela instrutória dos conteúdos do curso, acompanhada de recibo referentes as horas trabalhadas, bem como respectivos currículos;
d) ausência de informação sobre os segmentos turísticos contemplados, o número total de alunos matriculados, desistentes, bem assim os capacitados no curso ‘Qualificação no Atendimento ao Turista’;
e) ausência dos contratos firmados para a locação dos espaços, Faculdade Avantis, Centro Educacional Municipal Vereador Santa e Batalhão da Polícia Militar, acompanhados de recibos de pagamento;
f) quantitativos de alunos por turma superior ao estabelecido no Termo de Referência aprovado;
g) utilização de apostila de propriedade de Intelectus — Instituto de Desenvolvimento, a despeito de o MTur ter repassado recursos para confecção de apostila;
h) ausência dos comprovantes referentes ao material de consumo;
i) insuficiência da comprovação e da justificativa dos preços contratados da alimentação;
j) ausência da fixação da logomarca do Ministério do Turismo no material de divulgação;
k) ausência de nota fiscal e de exemplar do uniforme do curso;
l) pagamento de itens despesas não previstas no Plano de Trabalho aprovado.
13.3. O recorrente não apresentou quaisquer documentos que pudessem dirimir as irregularidades que constaram do Parecer Técnico de Prestação de Contas 18/2014 - CGQC/DCPAT/SNPDTur/MTur (peça 151). [...] (ID n. 158232259)
Ao cotejar o parecer técnico, adotado na íntegra, a Corte de Contas, destacando com maior relevo a previsão de contratação de professores responsáveis pela qualificação dos profissionais da área de turismo, anotou que:
13.7. No que concerne às professoras supostamente contratadas, observou-se que não existiu comprovação de que a sua eventual contratação tenha ocorrido para atender aos desígnios do Convênio 634/2008, uma vez que não foram apresentados contratos ou recibos pelos serviços prestados pelo município ou pela empresa por ele contratada (peça 151, 11). (ID n. 158232259)
E sobre o público alvo dos cursos, salientou que:
13.6. Do mesmo modo, as listas de presença não permitiram aferir se os alunos que ali foram registrados participaram do curso, uma vez que não apresentaram o endereço ou o telefone dos participantes para que fosse feita a checagem (peça 151, p. 16). (ID n. 158232259)
Daí por que, ao final, concluiu que “não houve comprovação da regularidade na prestação do objeto, tendo em vista que não encaminhou quaisquer documentos que pudessem afastar as conclusões consubstanciadas no Parecer Técnico de Prestação de Contas 18/2014” (ID n. 158232259, grifei).
Diante desse encadeamento de irregularidades, sopesadas em cenário de indefensável omissão no dever de prestar contas, e do desfecho da tomada de contas especial, regularmente apreciada pelo órgão competente, com rejeição do ajuste contábil, imputação de débito e imposição de multa, haja vista a condição de ordenador de despesas, à época, do ora recorrente, não há como alterar a conclusão do Tribunal Regional Eleitoral, pois harmônica com o texto do art. 1º, I, g, da LC n. 64/90, cujos requisitos de incidência estão preenchidos.
Afinal, (i) a insanabilidade fica evidente na postura de omissão na prestação de contas aliada à não comprovação de execução do objeto do convênio, na linha da jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral (REspEl n. 0600249-84/PA, Rel. Min. Sergio Banhos, DJe de 26.3.2021); (ii) as irregularidades, apuradas no exercício de cargo público (prefeito), estão assentadas em pronunciamento irrecorrível da Corte de Contas; e (iii) não se tem notícia sobre eventual suspensão ou anulação judicial desse acórdão.
Sobre a caracterização, em tese, de ato de improbidade administrativa – para o qual, conforme salientado acima, não mais se admite o dolo genérico –, tem-se como pouco razoável depreender que um gestor público, especialmente de um município de considerável porte, como no caso, possa se furtar, apenas com esteio em inabilidade ou imperícia técnica, a prestar contas, porquanto a ninguém é dado lidar com verba pública sem a adoção de critérios mínimos de controle e transparência, como se apenas assumisse um risco.
Ademais, assentado pela Corte de Contas, em pronunciamento cujo mérito não pode ser sindicado pela Justiça Eleitoral, que os valores repassados em convênio e sob a responsabilidade do agente ordenador da despesa foram empregados de forma absolutamente irregular, tanto que nem se comprovou a execução das atividades mínimas (leia-se: fundamentais) inerentes ao objeto da avença – como, na espécie, a qualificação do público alvo por meio de formação de turmas específicas com a contratação de professores e instrutores –, não há como subscrever a premissa de que esse comportamento não tenha sido deliberado, porquanto não se trata de aspectos marginais do convênio, esses sim sujeitos a algum tipo de variação por inaptidão do gestor, mas do núcleo do pacto.
Logo, também se extrai, no caso, a presença do requisito legal da conformação da rejeição de contas à configuração, em tese, de ato de improbidade administrativa mediante dolo específico do agente público.
Por fim, ancorado o voto em fundamentos reputados suficientes, descabe cogitar, meramente para efeitos de prequestionamento a eventual recurso, de menção aos numerosos preceitos listados nas razões do recurso.
Ante o exposto, nego provimento ao presente recurso ordinário.
É como voto.
VOTO
O SENHOR MINISTRO ALEXANDRE DE MORAES (presidente): Agradeço ao Ministro Carlos Horbach. Eu destaquei, então vou fazer algumas considerações, dizendo, desde logo, que vou acompanhar Sua Excelência o Ministro Carlos Horbach. E eu destaquei para fazer algumas considerações que me parecem importantes para que o Tribunal tome um posicionamento, principalmente em relação a essa questão de prestação de contas.
Nós, no Supremo Tribunal Federal, julgamos Ação Direta de Inconstitucionalidade de minha relatoria, inclusive, onde declaramos expressamente – inclusive, na verdade, não foi Ação Direta de Inconstitucionalidade, foi um ARE, um Agravo em Recurso Extraordinário, onde fixamos a tese de que não cabe responsabilidade objetiva em improbidade administrativa. Isso já era fixado anteriormente pelo Superior Tribunal de Justiça e pelo próprio Supremo Tribunal Federal. E que não há mais possibilidade do tipo culposo em nenhum dos tipos de improbidade administrativa, seja no art. 9º, seja no art. 10 – que previa expressamente a modalidade culposa –, seja no art. 11, que são os atos de improbidade atentatórios.
Eu sempre repito que, como não há previsão legal de tentativa de ato de improbidade, foi fixada uma regra de extensão de tipicidade no art. 11, que é um ato de improbidade atentatório. Ou seja, por exemplo, você tenta fraudar uma licitação, mas não obtém sucesso, você não enriquece, não há o enriquecimento. Então, consequentemente, o art. 9º não está tipificado. Não há prejuízo ao erário. O art. 10 da Lei de Improbidade não está tipificado, mas você atentou contra os princípios da administração pública – é o art. 11. Mas também há a necessidade de dolo. Isso foi fixado nesse ARE, o ARE 843989.
A questão – e eu ressalto aqui novamente – do dolo, do antigo dolo genérico, o dolo específico, ainda está para ser mais discutida na ADI 7236, também de minha relatoria, ajuizada pela Associação Nacional dos Procuradores da República, porque há atos de improbidade que realmente exigem especificamente uma conduta; há outros atos de improbidade, um pouco mais abertos, onde, constatada a vontade livre e consciente, já é possível a configuração.
E aqui nós temos um caso bem detalhado disso, como foi colocado pelo eminente Ministro Relator. Houve um convênio da prefeitura de Balneário de Camboriú, que celebrou convênio com o governo federal, para receber recursos e qualificar profissionais do setor de turismo para melhoria de qualidade no atendimento aos turistas do município.
Ótimo. Obviamente, se houve o convênio, houve o repasse de dinheiro, tem que haver a comprovação. Não há comprovação. Como se exigir mais do que isso? Como se exigir uma prova negativa, a chamada prova diabólica? Aqui, quem tem que comprovar é o gestor. Se o gestor não comprova, aqui não é questão de responsabilidade objetiva, não é questão de ausência de dolo. Ele não prestou contas de forma consciente e voluntária. Ou seja, ele acabou gerando um prejuízo; e acabou praticando um prejuízo à legislação, acabou praticando ato de improbidade.
Veja, a ausência da relação de quem foi treinado, a ausência de instrumento que comprove a contratação de professores responsáveis. Há algumas fotos. Há fotos dizendo: esse é o curso. Não dá nem para saber se realmente é o curso que foi realizado. Há ausência dos alunos. Não há uma lista de alunos. Ausência de contrato firmado para a locação dos espaços com a Faculdade Avante, Centro Educacional Município Vereador Santa e Batalhão da Polícia Militar. Ausência de comprovante referente ao material de consumo. Ausência de tudo. Ausência até do pagamento da alimentação, que disse utilizar.
Ou seja, recebeu um dinheiro, esse dinheiro foi gasto e não houve nenhuma prestação de contas aqui comprovada. Há o dolo e a inelegibilidade. É importante, a meu ver, essa fixação por parte do Tribunal Superior Eleitoral, sob pena de, como bem ressaltou o eminente Ministro Relator, agora todos os convênios, todo repasse de dinheiro, o gestor público fala: “Olha, eu errei realmente, não tem nenhuma comprovação, mas aconteceu. Tem aqui uma foto que aconteceu”. Isso realmente demonstra o dolo, porque não prestou as contas, não comprovou a utilização do recurso público. Comprovada, sim, a inelegibilidade prevista no art. 1º, inciso I, alínea g, da Lei Complementar 64, de 1990.
Exatamente por isso, pedi destaque para reforçar esse entendimento, para que – obviamente, em obtendo a maioria o voto do eminente Ministro Relator – fique bem claro que a prestação de contas é obrigatória; é obrigatória ao gestor público que recebeu os recursos, que gastou os recursos, que comprove no mínimo a realização do evento, com a contratação – aqui seria dos professores, monitores, dos alunos. Obviamente, uma falha ou outra, gerada por incompetência ou negligência, não gera improbidade. Mas aqui não é uma falha ou outra, aqui é simplesmente uma comprovação do uso do dinheiro. E o dinheiro simplesmente sumiu.
Então, eu acompanho integralmente o eminente Ministro Relator.
Há alguma divergência?
VOTO
O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI: Presidente, não há divergência, mas eu trago voto exatamente na linha que agora Vossa Excelência está explicitando. Nós decidimos aqui, eu estou citando o processo em que isso foi deliberado, de que não basta mais a mera presença do dolo genérico, é preciso que, para configuração do ato de improbidade, se comprove efetivamente que o agente público obrou com o fim de obter proveito ou benefício indevido para si ou para outra pessoa ou entidade.
Mas, como Vossa Excelência bem disse, e também o eminente relator, não é possível que um gestor público deixe de apresentar as contas. Quer dizer...
O SENHOR MINISTRO ALEXANDRE DE MORAES (presidente): O ônus da prova aqui se inverte.
O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI: ...o ônus da prova nesse caso, evidentemente, em face de um parecer técnico desfavorável, é justamente do agente público.
E, neste caso, eu estou dizendo, Senhor Presidente, na linha do relator e na linha agora que Vossa Excelência sublinha, eu digo que não é crível que o prefeito de um dos municípios mais desenvolvidos e turísticos de Santa Catarina, que é Balneário de Camboriú, não disponha de condições para cumprir o dever de prestar contas, nos termos que exige o art. 11, inciso VI, da Lei 8.429/92.
Portanto, meu pronunciamento, e peço vênia por ter me alongado um pouco mais, é justamente para reforçar esse ponto de vista que Vossa Excelência agora enfatiza, Senhor Presidente, que deve ser, a meu juízo, a perspectiva do Tribunal Superior Eleitoral é que não se pode admitir a não prestação de contas. Porque isso, por si só, já demonstra, digamos assim, um elemento subjetivo desfavorável ao agente público.
O SENHOR MINISTRO ALEXANDRE DE MORAES (presidente): Agradeço ao eminente Ministro Ricardo Lewandowski. Há alguma divergência?
PROCLAMAÇÃO DO RESULTADO
O SENHOR MINISTRO ALEXANDRE DE MORAES (presidente): O Tribunal, por unanimidade, negou provimento ao recurso ordinário, nos termos do voto do relator.
EXTRATO DA ATA
RO-El nº 0600765-75.2022.6.24.0000/SC. Relator: Ministro Carlos Horbach. Agravante: Edson Renato Dias (Advogados: Eduardo Ribeiro – OAB: 30785/SC e outros). Recorrido: Ministério Público Eleitoral.
Usou da palavra, pelo recorrente, Edson Renato Dias, o Dr. Eduardo Ribeiro.
Decisão: O Tribunal, por unanimidade, negou provimento ao recurso ordinário, nos termos do voto do relator.
Acórdão publicado em sessão.
Composição: Ministros Alexandre de Moraes (presidente), Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia, Benedito Gonçalves, Raul Araújo, Sérgio Banhos e Carlos Horbach.
Vice-Procurador-Geral Eleitoral: Paulo Gustavo Gonet Branco.
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